Por 7 votos a 4, o
Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em julgamento nesta quarta-feira (17),
admitir que um réu condenado na segunda instância da Justiça comece a cumprir
pena de prisão, ainda que esteja recorrendo aos tribunais superiores.
Assim, bastará a
sentença condenatória de um tribunal de Justiça estadual (TJ) ou de um tribunal
regional federal (TRF) para a execução da pena. Até então, réus podiam recorrer
em liberdade ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao próprio Supremo
Tribunal Federal (STF).
Desde 2009, o STF
entendia que o condenado poderia continuar livre até que se esgotassem todos os
recursos no Judiciário. Naquele ano, a Corte decidiu que a prisão só era
definitiva após o chamado “trânsito em julgado” do processo, por respeito ao
princípio da presunção de inocência.
O julgamento desta
quarta representa uma mudança nesse entendimento. Até então, a pessoa só
começava a cumprir pena quando acabassem os recursos. Enquanto isso, só era
mantida encarcerada por prisão preventiva (quando o juiz entende que ela
poderia fugir, atrapalhar investigação ou continuar comentendo crimes).
Votaram para
permitir a prisão após a segunda instância os ministros Teori Zavascki
(relator), Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen
Lúcia e Gilmar Mendes. De forma contrária, votaram Rosa Weber, Marco Aurélio
Mello, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski.
Nos votos, os
ministros favoráveis à prisão após a segunda instância argumentaram que basta
uma decisão colegiada (por um grupo de juízes, como ocorre nos TJs e TRFs) para
aferir a culpa de alguém por determinado crime.
Em regra, os
recursos aos tribunais superiores (STJ e STF) não servem para contestar os
fatos e provas já analisadas nas instâncias inferiores, mas somente para
discutir uma controvérsia jurídica sobre o modo como os juízes e
desembargadores decidiram.
A favor
Relator do caso, Teori Zavascki argumentou que a possibilidade de recorrer em liberdade estimula os réus a apresentar uma série de recursos em cada tribunal superior, até mesmo a ponto de obter a prescrição, quando a demora nos julgamentos extingue a pena.
Relator do caso, Teori Zavascki argumentou que a possibilidade de recorrer em liberdade estimula os réus a apresentar uma série de recursos em cada tribunal superior, até mesmo a ponto de obter a prescrição, quando a demora nos julgamentos extingue a pena.
“Os apelos extremos,
além de não serem vocacionados à resolução relacionada a fatos e provas, não
acarreta uma interrupção do prazo prescricional. Assim, ao invés de constituir
um instrumento de garantia da presunção de não culpabilidade do apenado, [os
recursos] acabam representando um mecanismo inibidor da efetividade da
jurisdição penal”, afirmou.
Seguindo essa linha,
Luís Roberto Barroso chamou o atual sistema de “desastre completo”. “O que se
está propondo é de tornar o sistema minimanente eficiente e diminuir o grau de
impunidade e sobretudo de seletividade do sistema punitivo brasileiro. Porque
quem tem condições de manter advogado para interpor um recurso atrás do outro
descabido não é os pobres que superlotam as cadeias”.
Contra
Primeira a divergir, Rosa Weber afirmou ter “dificuldade” em mudar a regra até agora aplicada pelo Supremo. “Embora louvando e até compartilhando dessas preocupações todas, do uso abolutamente abusivo e indevido de recursos, eu talvez por falta de reflexão maior, não me sinto hoje à vontade para referenda essa proposta de revisão da jurisprudência”.
Primeira a divergir, Rosa Weber afirmou ter “dificuldade” em mudar a regra até agora aplicada pelo Supremo. “Embora louvando e até compartilhando dessas preocupações todas, do uso abolutamente abusivo e indevido de recursos, eu talvez por falta de reflexão maior, não me sinto hoje à vontade para referenda essa proposta de revisão da jurisprudência”.
Presidente da Corte,
Lewandowski também discordou da mudança do entendimento sobre a presunção de
inocência e alertou para o aumento do número de presos que virá com a decisão.
“O sistema
penitenciário está absolutamente falido, se encontra num estado
inconstitucional de coisas. Agora nós vamos facilitar a entrada de pessoas
nesse verdadeiro inferno de Dante, que é o sistema prisional”, afirmou.
Reação
Após a decisão, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que defendeu a mudança, divulgou nota afirmando tratar-se de um “passo decisivo contra a impunidade no Brasil”.
Após a decisão, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que defendeu a mudança, divulgou nota afirmando tratar-se de um “passo decisivo contra a impunidade no Brasil”.
“Proferida a decisão
no tribunal de origem em que as circunstâncias de fato foram acertadas,
qualquer recurso para o STJ ou STF, ensejará a discussão somente de questão
jurídica”, disse, ainda durante o julgamento.
Em nota, a
Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) saudou a mudança, semelhante a
proposta apresentada pela entidade ao Congresso. “Esse é um dos principais
pontos da nossa a agenda. A mudança na interpretação da lei emanada pelo
plenário da Suprema Corte reforça a adequação e pertinência da nossa proposta”,
afirmou em nota o presidente da entidade, Antônio César Bochenek.
Criminalista atuante
no STF há 37 anos, o advogado Nélio Machado criticou a decisão. Para ele, ela
permite que uma pessoa comece a cumprir pena mesmo se depois um tribunal
superior entender que houve erro nas decisões anteriores.