O Governo de Pernambuco – através da Secretaria de
Cultura, Fundarpe, Secretaria de Turismo e Empetur – encerrou, na última
sexta-feira (18), as inscrições da Convocatória do Carnaval 2016. No mesmo dia,
o cantor e compositor Alcymar Monteiro publicou em sua fã page no Facebook uma
carta aberta aos gestores da cultura e do turismo do Estado, cobrando o
pagamento de seu cachê pelas apresentações que realizou nas cidades de
Arcoverde, Tuparetama e Santa Cruz do Capibaribe, durante o Ciclo Junino.
Diz Alcymar em determinado trecho da carta: “Não recebi
até hoje um centavo pelo serviço prestado. Pior: não há previsão de pagamento.
E o arremate final: o descaso e desdém com que eu, e aposto, vários outros
artistas, são tratados quando cobram os valores devidos. O resumo da ópera é
que paguei para cantar para o Governo de Pernambuco. Arquei despesas com
transporte, equipe de filmagem, hospedagem, alimentação, impostos e tudo o
mais. Despesas para manter a carreira girando, como luz, telefone, aluguel,
funcionários… Fora os riscos aos quais estamos sujeitos pelas estradas de nosso
estado. Até agora, seis meses depois, não recebi nada. Nem um telefone de
cortesia para informar uma previsão de pagamento. O que recebi foi o desprezo.”
Leia na íntegra a carta aberta do forrozeiro:
À comunidade artística de Pernambuco.
Começo esse texto me dirigindo diretamente ao Governador
Paulo Câmara, ao secretário de Cultura Marcelino Granja, à presidente da
Fundarpe Márcia Souto, ao secretário de turismo Felipe Carreras e à presidente
da Empetur Ana Paula Vilaça.
Todos que lêem jornais ou acompanham minimamente o
desenrolar do quadro econômico do Brasil sabem que estamos em crise. Crise que
atinge todas as camadas sociais. Sou sensível a isso. Porém já estamos em
dezembro, e lá se vão seis meses que emprestei minha voz e meu talento para
integrar os festejos de São João do Governo de Pernambuco, através da Empetur e
da Fundarpe.
Os shows foram feitos. Alugamos ônibus e van. Levamos
equipe de filmagem até os locais para filmar o show e tirar fotos do evento –
exigência do edital. A banda chegou no horário devido, se hospedou na cidade.
Almoçamos, passamos o som, jantamos. Fizemos os shows e a alegria de uma
população sofrida, mas sempre animada, como é típico do pernambucano. Acordamos
bem cedo e pegamos a estrada rumo a outro destino. 30 dias depois de feito o
show nosso representante pagou os impostos da nota fiscal, como toda empresa
faz ao prestar qualquer serviço a qualquer Governo. Prestei todas as
informações pedidas, entreguei todos os documentos solicitados, e fiz tudo
aquilo que me foi exigido. Essa rotina se repetiu três vezes nesse ano, nas
cidades de Arcoverde, Tuparetama e na terra de meu pai, Santa Cruz do
Capibaribe. Até aí um breve relato que qualquer artista, iniciante ou renomado,
conhece de cor.
Só há um problema nessa história: não recebi até hoje um
centavo pelo serviço prestado. Pior: não há previsão de pagamento. E o arremate
final: o descaso e desdém com que eu, e aposto, vários outros artistas, são
tratados quando cobram os valores devidos. O resumo da ópera é que paguei para
cantar para o Governo de Pernambuco. Arquei despesas com transporte, equipe de
filmagem, hospedagem, alimentação, impostos e tudo o mais. Despesas para manter
a carreira girando, como luz, telefone, aluguel, funcionários… Fora os riscos
aos quais estamos sujeitos pelas estradas de nosso estado. Até agora, seis
meses depois, não recebi nada. Nem um telefone de cortesia para informar uma
previsão de pagamento. O que recebi foi o desprezo.
Não quero nem entrar no mérito de isso quase sempre
ocorrer com artistas da terra. Perguntem a qualquer atração que venha do eixo
Rio-SP, ou até de Salvador, e podem ter certeza que quase a totalidade deles
recebeu ou antecipadamente, ou de forma extremamente rápida. Só isso já é um
escândalo em si próprio, que mostra bem o valor que nosso governo dá aos seus
conterrâneos, mas já ficou tão diluído no teatro do absurdo, que se tornou
informação menor.
Para quem não sabe o Governo de Pernambuco é um dos mais
exigentes – com toda razão – em relação ao cumprimento dos editais de seus
shows. Temos que cumprir uma série de formalidades, além de apresentar mais de
vinte certidões das mais variadas exigências: de que não empregamos menores de
idade, de que não utilizamos trabalho escravo e por aí vai. O Governo também
exige que filmemos o evento, além de banners e faixas, que comprovem nossa
presença nos shows. Fora isso o Governo exige que, para o prosseguimento do
processo de pagamento, todos os impostos estejam pagos antecipadamente. Tudo
isso não teria nenhum problema se o mais simples fosse feito: o Governo pagasse
na data combinada a quem deve.
Tenho 33 anos de carreira. Mais de 90 discos lançados.
Alguns deles, com orgulho, na Europa e nos Estados Unidos. Sou representante da
cultura de um povo com 60 milhões de habitantes. Respiro música e cultura 24
horas por dia. Vivo disso. Essa é a minha lavoura, meu ganha-pão. Da minha
garganta eduquei meus filhos e dou emprego a quase 50 pessoas. Pessoas essas
cujas famílias se alimentam graças a esses eventos. Shows musicais não são
farras – como dito por alguns. São manifestações folclóricas de um povo, que
eu, humildemente, tento traduzir e reproduzir, levando aos quatro cantos do
mundo.
O que peço, encarecidamente, não é nada demais. Só peço
respeito. Peço que paguem o que devem, não só a mim mas a vários outros
artistas. Peço ao Governador Paulo Câmara, que se espelhe em seu antecessor – o
amigo e saudoso Eduardo Campos – e que veja a classe artística com olhos mais
de poeta e menos de economista. Peço aos secretários Carreras e Granja, à
Presidente da Fundarpe Márcia Souto e à presidente da Empetur Ana Paula Vilaça,
que vejam a classe artística pernambucana como prioridade – sempre – e não como
produtos de segunda classe. Espero também que todos os envolvidos vejam essa
missiva não como um produto de raiva ou rancor, e sim uma cobrança pelo que é
justo e direito. Existem artistas que já me confidenciaram ter vontade de sair
do meio, tamanha a falta de respeito que têm sofrido. Calar um artista,
sufocando-o ao ponto em que ele não tenha mais condições de fazer do seu ofício
sua arte é um ato de lesa-cultura, é calar a voz do povo.
Antonio Alcymar Monteiro dos Santos, artista brasileiro.