O governo vai intensificar, nos próximos
dias, as conversas com os dois principais segmentos religiosos do país: os
católicos e os evangélicos, avessos às propostas de reforma da Previdência.
Representando quase 80% das pessoas que possuem alguma crença, os dois
segmentos têm feito campanha contra as mudanças na aposentadoria apresentadas
por Michel Temer. “Nós somos cobrados diariamente pelos nossos fiéis. As
propostas que estão aí afetam muito os mais pobres”, alertou o deputado Ronaldo
Fonseca (Pros-DF), integrante da bancada evangélica.
Temer
reuniu-se com alguns parlamentares evangélicos na última quinta-feira, quando
recebeu uma pauta de demandas do grupo. Ele marcou um café da manhã para a
próxima semana com um quórum mais ampliado. “Não nos falou nada sobre a
Previdência. Mas, se ele tocar no assunto, vamos expor nossa opinião”,
completou Ronaldo Fonseca. O parlamentar de Brasília disse que não há como
fugir da cobrança dos fiéis mais carentes, que estão se sentindo ameaçados
pelas propostas feitas pelo governo.
“As
classes C, D e E, que são a maioria de nosso público, também são as mais
afetadas. São aquelas pessoas que não têm renda extra, não têm um imóvel
alugado e precisam da aposentadoria para ter uma velhice mais tranquila”,
completou o deputado do Pros. A preocupação do governo é importante: a bancada
evangélica reúne mais de 90 parlamentares. Em uma votação que necessita de uma
quantidade elevada de votos para ser aprovada — no mínimo 308 votos —– um
grupamento do tamanho dos evangélicos não pode ser menosprezado. “Somos base do
governo Temer. Mas não podemos votar nessa matéria por votar”, completou o
deputado do Pros.
Sem
representantes oficialmente declarados e com atuação política segmentada no
Congresso, os católicos também representam uma ameaça às mudanças na
Previdência propostas pelo governo. No fim de março, a Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil (CNBB) divulgou uma dura nota posicionando-se contra a
reforma. “Os números do governo federal que apresentam um deficit
previdenciário são diversos dos números apresentados por outras instituições,
inclusive ligadas ao próprio governo. Não é possível encaminhar solução de
assunto tão complexo com informações inseguras, desencontradas e
contraditórias. Iniciativas que visem ao conhecimento dessa realidade devem ser
valorizadas e adotadas, particularmente pelo Congresso Nacional, com o total
envolvimento da sociedade”, dizem os bispos no comunicado.
Para a
vice-presidente da Ideia Inteligência, Cila Schulmann, as igrejas têm atingido
um poder de mobilização muito maior do que os sindicatos nesse debate de
reforma. “Elas estão conseguindo chegar em rincões que os sindicatos não
conseguem”, reforçou. Há quase um mês, o senador Garibaldi Alves (PMDB-RN) já
alertara o presidente Temer de que padres nas paróquias espalhadas pelo interior
do país estavam fazendo pregações contra as mudanças na Previdência. Temer
também conversou com dom Sérgio tão logo o documento foi divulgado.
“A Igreja
acaba se aproveitando da sua proximidade com os fiéis da área rural, que têm
sido bastante afetados pela reforma”, disse o senador Paulo Rocha (PT-PA).
Oriundo do movimento sindical, Rocha reconhece que, em tempos de crise
econômica, os sindicatos acabam por perder poder de fogo, já que as pessoas
preferem manter os empregos a aderir às mobilizações de rua. “Mas não vejo como
duas forças antagônicas (igreja e sindicato). Ambas foram fundamentais para a
fundação do PT”, completou.