Quando Antônio Conselheiro bradava, no
final do século 19, na Bahia, que “o sertão vai virar mar e o mar vai virar
sertão”, ele não podia imaginar que a severa estiagem no Nordeste no século 21
colocaria a seca e o mar lado a lado.
A seca que atinge a região há cinco anos é considerada a
maior em pelo menos 106 anos de medições e trouxe uma nova característica: a
falta de chuvas nas regiões de zona de mata e até no litoral nordestino.
Segundo um mapa da vegetação feito por satélite pelo Lápis
(Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites), da
Universidade Federal de Alagoas, a área atingida pela seca cresceu ao longo dos
anos e encostou no mar. Em comparação a anos anteriores, é possível ver como o
estrago aumentou ao longo de 2016.
Segundo o coordenador do Lápis, o meteorologista e professor
Humberto Barbosa, as características e a área da seca atual são maiores que
todas já acompanhadas pela ciência até hoje.
Dados da Funceme (Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos
Hídricos) apontam que desde 1910 –quando os números começaram a ser
registrados– nunca houve cinco anos com pouca chuva como a sequência entre 2012
e 2016. A maior seca havia sido registrada entre 1979 e 1983, mas a chuva no
quinquênio que se encerra neste ano está apenas 10% menor.
Meteorologista da Funceme, Raul Fritz afirma que “nada
escapou” à severa estiagem nesta década. “A seca sai do semiárido e está
alcançando praticamente o mar. Isso nunca tinha ocorrido antes. A seca sempre
atinge, de certa forma, a região próxima ao litoral, mas nunca no grau que
dessa vez aconteceu”, conta.
Ainda sem previsão para 2017: Segundo
Fritz, a perspectiva para 2017 ainda é uma incógnita. “Nós não temos ainda
elementos científicos para assegurar que vai chover acima da média. Temos que
esperar janeiro para fazer um primeiro prognóstico, quando temos um quadro
atmosférico e oceanográfico mais claro”, explica.
A possibilidade otimista aponta para chuvas no primeiro
trimestre. “Estamos no período de pré-estação chuvosa, entre dezembro e
janeiro. Normalmente, as chuvas vêm no volume maior em fevereiro e março.
Eventualmente, em um ano ou outro temos um janeiro mais chuvoso, como foi 2016
aqui no Ceará, mas que não foi suficiente para encher os reservatórios que
sofreram esses anos todos”, completa Fritz.